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quarta-feira, 27 de novembro de 2013

DAS DELÍCIAS DO MUNDO CORPORATIVO

Escritores gostam de tirar fotos para os seus livros com charuto na mão. Se for o primeiro livro com edição paga pelo autor, o charuto é certo. O fundo é uma biblioteca, e o escritor aparece com um charuto na mão fazendo cara de que cumpriu parte do favor dele ao mundo escrevendo o livro e ainda por cima se deixando fotografar.

Nos discos e programas guascas, a cuia de chimarrão é onipresente. A vestimenta, bombacha e botas, é muito convenientes para a vida e as lidas dos artistas gaudérios: ir ao banco, a uma reunião para pleitear um patrocínio, no centro da cidade, enfim, essas coisas que exigem esse tipo de indumentária apropriada. E se o momento for ficar para a posteridade, faz-se mister segurar uma cuia de chimarrão.

Mas, nesse caso, pelo menos, o chimarrão é inofensivo. Na capa dos discos. Se é que tem chimarrão ali, pois eu tenho sempre a impressão que a cuia está vazia na foto.

Tem gente que não consegue se desgrudar do chimarrão nem pra dirigir. Nem na praia. Deve ser um espetáculo água quente com areia.

E tem a turma que toma chimarrão no serviço. Pra essa turma, o trabalho começa, efetivamente, uns 45 minutos depois dos outros. É sempre a mesma cena: a briga porque a cuia está suja e ninguém lavou, reunião para decidir o escalonamento da limpeza da cuia. Só da cuia. Pra limpar a bomba é outro tumulto. 

“Quem vai tomar chimarrão hoje?” “Eu! Eu! Eu! Eu!” Tumulto de vozes gritando desordenadamente que precisam muito de chimarrão.

Um dos que gritou “Eu!” e é sempre o primeiro a gritar todos os dias, está começando a ser boicotado pois não compra erva há uns dois anos. Outro chega com erva toda segunda. É brinde de um posto de gasolina, a qualidade é terrível e não dá pra meia cuia. Outro reclama que só gosta daquela marca que só usa as folhas. Outro gosta da marca que mistura ervas com chás diversos e ajuda a regular o intestino. E o intestino se regula pra ser acionado sempre em horário de trabalho. Alguém só aparece com uma erva que só pode ser comprada no mercado público, o que, na lógica dele, o isenta de levar erva pelos próximos cinco anos. E, claro, sempre tem um sujeito com uma erva que só ele consegue, de um lugarzinho no interior de um sítio de Cacique Doble, nos fundos, que só é vendida pra quem conhece o dono e o cunhado dele. É igual a todas as outras ervas. E também o isenta de novas remessas de erva pelos próximos cinco anos.

“De quem é agora?” “Eu! Eu! Eu! Eu!”. Até que alguém vira o mate sobre uns documentos. E amanhã as mosquinhas continuarão voando sobre a cuia suja.

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