Páginas

domingo, 8 de janeiro de 2017

LEITURA DE DOMINGO

Por que o negrinho se chama brigadeiro no resto do país

          Cláudio Moreno
Uma jovem leitora de Porto Alegre, Laura M., faz uma pergunta que muitos outros, tenho certeza, gostariam de fazer: "Professor, eu gostaria de saber por que chamamos de negrinho, aqui no Rio Grande do Sul, o doce que todo o resto do Brasil chama de brigadeiro. Minha avó, que é sua fã de carteirinha, tem certeza de que o senhor pode esclarecer minha dúvida".

Prezada Laura: muito me comove a confiança da senhora tua avó, mas neste caso do brigadeiro não posso ir além de simples conjecturas. As fontes digitalizadas de que dispomos para pesquisa não ajudam muito, pois são quase todas literárias; para determinar com segurança a história dos nossos docinhos de aniversário seria necessária, em lugar disso, uma boa coleção de livros ou revistas de culinária, ordenada cronologicamente. Talvez algum dia, quem sabe...

Vou tomar a liberdade de inverter a tua pergunta: por que razão o doce tornou-se conhecido como brigadeiro no resto do país? Vamos convir que este é um nome assaz estranho, quando o comparamos com as bananinhas, os cajuzinhos, os amendoinzinhos e todos aqueles outros "inhos" que enfeitam (ou melhor, enfeitavam) as mesas de doces da nossa infância. Nota que é um nome bélico, um posto nas Forças Armadas – no caso, um dos mais altos escalões da Aeronáutica, com status similar, eu presumo, ao dos contra-almirantes da Marinha –, personagem tão importante na esfera celeste que chamamos o céu azul e sem nuvens de céu de brigadeiro. Pois aqui está o mistério: como explicar que um nome tão marcial tenha pousado no inocente cenário dos aniversários infantis? Conta a lenda – eu sou muito desconfiado com essas etimologias populares – que o nome teria "colado" no doce por causa da intensa campanha política do brigadeiro Eduardo Gomes, que por duas vezes disputou a Presidência da República na Era Vargas, sendo derrotado em ambas as tentativas. 

Para obter fundos para sua campanha, dizem, seus correligionários promoviam a venda de doces confeccionados com leite condensado e chocolate, que teriam passado, então, a ser conhecidos popularmente como brigadeiros...

Apesar de um tanto ingênua, a hipótese pode até ser verdadeira, já que não vejo outro fator que pudesse associar um nome tão específico da hierarquia militar com um doce que, certamente, já era conhecido muito antes dessa disputa eleitoral – afinal, o leite condensado foi introduzido no Brasil no final do séc. XIX, e não deve ter demorado muito para alguma doceira criativa levá-lo ao fogo para apurar o seu ponto. Talvez até essa hipótese política explique por que o nome brigadeiro não teve boa acolhida em nosso Estado, marcadamente getulista.

Queres um bom palpite? Os gaúchos, sempre minimalistas e polarizadores, preferiram distinguir os dois tipos básicos de doce de leite condensado apenas pela cor – negrinhos e branquinhos – e não se sentiram movidos, como nos outros Estados, a adotar a denominação de brigadeiro para os primeiros, nem a de beijinho para os outros. Não por acaso, os dicionários que registram isso classificam tanto negrinho quanto branquinho como "regionalismo do Sul". Sabes como é: eles usam o nome errado e dizem que nós é que somos diferentes...

http://zh.clicrbs.com.br/rs/opiniao/colunistas/claudio-moreno/noticia/2016/10/brigadeiro-7683261.html#miolo

Nenhum comentário:

Postar um comentário