"O passante que naquela manhã cinzenta de março de 1897 atravessasse por sua conta e risco a place Maubert, ou a Maub, como a chamavam os malfeitores (centro da vida universitária já na Idade Média, quando acolhia a multidão de estudantes que frequentava a Faculdade das Artes no Vicus Stramineus ou rue duFouarre, e mais tarde local da execução capital de apóstolos do livre-pensamento como Étienne Dolet), se encontraria em um dos poucos lugares de Paris poupado das demolições do barãoHaussmann, no meio de um emaranhado de becos malcheirosos, cortados em dois setores pelo curso do Bièvre, que ali ainda se extravasava daquelas vísceras da metrópole, onde fora confinadohavia tempo, para se lançar febricitante, estertorante e verminoso no Sena muito próximo. Da place Maubert, já desfigurada pelo boulevard Saint-Germain, partia ainda uma teia de vielas, como a rue Maître Albert, a rue Saint-Séverin, a rue Galande, a rue de la Bûcherie, a rue Saint-Julien-le-Pauvre, até a rue de la Huchette, todas disseminadas de hotéis sórdidos mantidos em geral por auvérnios, estalajadeiros de lendária cupidez, que pediam um franco pela primeira noite e quarenta cêntimos pelas seguintes (mais vinte soldos, se a pessoa também quisesseum lençol)."
Cemitério de Praga - Umberto Eco - 2010
Cemitério de Praga - Umberto Eco - 2010
Nenhum comentário:
Postar um comentário