Adeus, doce França.
José Lins do Rêgo
Volto hoje às minhas criaturas, aos rudes homens do cangaço,
às mulheres, aos sertanejos castigados, às terras tostadas de sol e tintas de
sangue, ao mundo fabuloso do meu romance, já no meio do caminho.
Os dias de França me deram uma sensação de pausa, de
espanto, de novos contactos sonhados desde menino. Vi terras por onde andaram
os doze pares de França, os heróis do meu Carlos Magno, lido e relido como
história de Trancoso. Vi terras do sul, o mar Mediterrâneo, o mar da história,
o mar dos gregos, dos egípcios, dos fenícios, dos romanos. Mas o nordestino
tinha que voltar à sua realidade, à realidade maior que a história do mundo,
isto é, à história dos seus homens, dos cangaceiros brutais, carregados de vida
bárbara, de instintos cruéis de uma força, porém, que não se extingue nunca,
porque é a energia de uma raça de homens mais duros do que as pedras dos seus
lajedos.
Volto aos “Cangaceiros” e desde logo tudo o que vi e senti
se refugia no fundo da sensibilidade, para que a narrativa corra, como em leito
de rio que a estiagem secara, mas que as águas novas enchem, outra vez, de
correntezas.
Volto ao terrível Aparício que mata igual a um flagelo de
Deus, ao monstruoso Negro Vicente, ao triste Bentinho, ao místico Domício, aos
umbuzeiros carregados de frutos, aos mandacarus de floração de sangue, aos
cantadores de estrada, às mulheres sofredoras, às noites de lua, aos tiroteios,
ao crime e ao amor, à poesia barbaresca e vigorosa de um povo que é maior do que
a terra que o criou.
Volto contente e disposto a tudo.
Adeus, doce França. Agora os espinhos me arranham o corpo e
as tristezas me cortam a alma.
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