Primo escreve sobre uma canção de Roger Waters:
Get back to radio ficou perdida nas gravações do Radio Kaos,
o segundo disco solo pós-Floyd do Roger Waters. Resta saber as razões desta
esquisita opção: ela é superior a várias canções do Radio Kaos e se encaixa
tematicamente no conceito do disco. Musicalmente bem construída - e repleta de
efeitos de teclado, sax ao fundo com direito a pequeno solo -, ela recupera um
estilo vocal que Waters vinha construindo e trabalhando desde o Final Cut (além
dos efeitos de pedal de voz e de duplicação de voz): cada frase é cantada de um
jeito diferente, exprimindo com sua voz, é claro, aquilo que a frase exatamente
quer dizer.
Pode-se dizer que a limitada voz do Roger Waters é um
instrumento; mas não é um instrumento de virtuose. É um instrumento (no sentido
lato do termo) a serviço daquilo que o Roger tem a dizer. Ninguém consegue
fazer isto no rock and roll (embora, tecnicamente falando, todos cantem melhor
que o Roger Waters). E o resto todo mundo sabe (mesmo quem não gosta do Roger
Waters): ele sempre tem alguma coisa a dizer.
Bom, sabe-se que o Roger Waters, ainda que não possa ser
considerado um monotemático, é um repetitivo incorrigível e incoercível. Sua
mãe, Syd Barrett, a morte do pai. Há quarenta anos é a mesma estória. E, quando
a estória muda de personagem, trata-se ainda da mesma estória: o personagem
está encolhidinho, do lado de lá do muro, oprimido por uma sociedade sem
valores.
Se você entrevistar algum destes músicos esquerdinhas que
vivem por aí, é possível que ele fale mal da MTV. Mas se você não entrevistá-lo
e, ao invés, encontrá-lo num bar, ele vai dizer a mesma coisa que diria na
entrevista. Para ele, é um fato (um fato bruto) que a MTV é ruim. Ele só
precisa dizer isso.
Não é o caso do Roger Waters. Pegue o caso de Get back to
radio: antes de falar mal da MTV, vamos lembrar de um soldado que ficou
congelando no frio, pois alguém precisa ficar representando o país diante de um
bandeira tremulando. Antes ainda é bom lembrar que estamos todos sozinhos, mas
podemos nos conectar por alguma espécie de onda sonora (isto havia sido tema do
Radio Kaos, é bom lembrar). Agora sim: nós não vamos nos dobrar para a MTV!!!!
Eu sou um homem e não um número!!!!! Acabou???? Não. Nesta solidão toda, no
meio do desespero que ele inventou, implora para que a primeira ex-mulher pegue
na sua mão. Agora: é um homem sozinho ouvindo rádio. E então a grande invenção:
não é só ele – há toda uma geração esperando por um novo rádio (ele berra nesta
hora da música). Mas é invenção. Invenção de um gênio. Olhando o rádio, lembra
do Bob Geldoff: que Deus o abençoe, fecha Roger Waters.
Se o Roger Waters aparecer no Nicko’s em uma tarde fria de
sábado e nos encontrar, ele vai acrescentar algumas coisas, mudar outras. Mas
vai falar a noite toda, quantas vezes for necessário, até que eu e o primo
deixemos bem claro que entendemos o que ele quis dizer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário