Do site da Folha
Justiça concede a João Gilberto o direito de reaver seus
clássicos da bossa nova
FABIO BRISOLLA
DO RIO
O músico João Gilberto está prestes a reaver o controle
sobre três discos que definiram a bossa nova. Na última sexta-feira (26), a
juíza Simone Dalila Nacif Lopes, da 2ª Vara Civil do Rio, concedeu liminar que
obriga a gravadora EMI a entregar ao compositor as "masters" dos LPs
"Chega de Saudade", "O Amor, o Sorriso e a Flor" e
"João Gilberto", além do compacto vinil "João Gilberto cantando
as músicas do filme Orfeu do Carnaval".
No jargão da indústria fonográfica, master é a matriz de um
disco que dá origem à produção das cópias autorizadas. Com a decisão, João
Gilberto pode ter a chance de relançar seus três clássicos, que deixaram de ser
produzidos em 1992, no curso da briga judicial com a EMI.
A juíza determinou que as matrizes sejam entregues pela
gravadora até quarta-feira da próxima semana (8 de maio) no escritório do
representante do músico na ação, o advogado Flávio Antônio Esteves Galdino.
Caso descumpra a determinação, a EMI terá de pagar multa estipulada em R$ 100
mil e haverá uma operação de busca e apreensão do material.
Tuca Vieira-14.ago.08/Folhapress
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Em sua decisão, Simone Lopes justificou a importância da
transferência imediata dos discos para o autor: "é evidente a urgência de
viabilizar que João Gilberto, aos 81 anos, possa se debruçar sobre sua obra
para atualizá-la, com os recursos tecnológicos contemporâneos e sob seu crivo
de qualidade, havendo inegável risco de o artista já não ter condições para
tanto, se esperar pelo julgamento final."
A EMI não pode produzir novas cópias e comercializar os
discos de João Gilberto sem sua autorização. Por isso, na avaliação da juíza da
2ª Vara Civil, com as matrizes em posse da gravadora "a obra-prima de João
Gilberto permanecerá aprisionada, sem que o público, seu verdadeiro
destinatário, possa dela usufruir".
Uma coletânea lançada em 1987 pela EMI deu início à disputa
judicial. Sem a autorização de João Gilberto, a gravadora reuniu os três LPs em
um álbum triplo, batizado como "O Mito", no mercado brasileiro. Nos
Estados Unidos, o mesmo álbum foi comercializado como "The Legendary João
Gilberto".
Além de não ter participado da concepção deste subproduto de
sua obra, o compositor acusou a gravadora de distorcer a sonoridade das músicas
originais durante a produção do novo disco. A ordem das faixas também acabou
alterada pela EMI.
Em 2011, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu as
alterações nas canções remasterizadas e condenou a EMI a indenizar João
Gilberto "por violação ao direito moral do autor".
Apesar da decisão favorável do STJ, as matrizes dos álbuns
"Chega de Saudade", "O Amor, o Sorriso e a Flor" e
"João Gilberto" permaneciam como propriedade da EMI e, portanto,
impossibilitadas de voltar ao mercado.
Na véspera do aniversário de 80 anos de João Gilberto, o
escritor Ruy Castro lamentou a ausência dos LPs em sua coluna na Folha:
"Imagine se os profetas do Aleijadinho estivessem, não expostos no adro da
igreja, mas encaixotados e recolhidos a um almoxarife em Congonhas. Ou que,
tantos anos depois de estreada, a peça 'Vestido de Noiva', de Nelson Rodrigues,
não pudesse mais ser encenada. Ou que o romance 'Grande Sertão: Veredas', de
Guimarães Rosa, já consagrado, não fosse mais reimpresso."
Procurada pela Folha, a direção da EMI não se pronunciou
sobre o assunto.
Advogado de João Gilberto, Flávio Antônio Esteves Galdino
preferiu não conceder entrevista sobre o caso.
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