Aos 50 anos, Quentin Tarantino se vê como um "realizador de dramas"
Ana Maria Bahiana
Do UOL, em Los Angeles
Autodidata -- “não fiz faculdade de cinema, vi filmes. O cinema me ensinou cinema” --, absolutamente passional sobre seu ofício, desconfiado das novidades tecnológicas -- “digital me dá sempre impressão de coisa feita para TV”-- Quentin Jerome Tarantino, de Knoxville, Tennessee, trouxe um vigor pop para a cena do cinema independente que se desenhava em meados dos 1990, e apresentou e reapresentou a novas gerações gêneros de outros tempos e nacionalidades: filme noir, blaxploitation, ação wuxia chinesa, terror slasher, faroeste espaguete, ação-aventura de guerra.
No processo, reinventou a carreira de John Travolta (“Pulp Fiction”), prestou a devida homenagem à diva black Pam Grier (“Jackie Brown”), transformou Uma Thurman numa heroína de ação (“Kill Bill 1”, 2 e o 3, que vem aí), lançou o austríaco Christoph Waltz em Hollywood (e no meio de uma chuva de prêmios -- “Bastardos Inglórios”, “Django Livre”) e resolveu de modo muito pessoal a antiga tensão entre comércio e arte que está na base do cinema, especialmente do cinema americano. “Eu ainda não esgotei a visitação aos meus gêneros favoritos”, ele diz. “Ainda há muito que fazer.”
Um balanço dos 50 anos de Quentin Tarantino, por ele mesmo.
A melhor coisa de fazer 50 anos:É bom não ser mais considerado um garoto. Quando eu comecei, quando “Cães de Aluguel” foi lançado, tudo o que diziam e escreviam sobre mim era para me chamar de garoto, de adolescente, que eu tinha aprendido cinema na videolocadora, etc. É bom saber que pelo menos agora eu tenho mais a oferecer.
O que aprendeu com a maturidade:Eu comecei a acreditar em vidas passadas os últimos dez anos. Sempre pensei nisso, mas de uns anos para cá eu realmente me convenci que isso existe. Como tudo comigo eu não estou cem por cento comprometido com o conceito mas… eu não me surpreenderia se isso fosse verdade. Eu acredito que é inteiramente possível.·
O que mudou ao longo desses anos:Nada no mundo mudou ao ponto de afetar minha arte. Nada, nada, nada. Minha arte, minha voz, minha imaginação, meus personagens, meu modo de contar histórias, tudo isso vai por onde eu quero que vá independente do que acontece no planeta Terra. Isso é meio parte do meu trabalho, não é?
Como vê sua filmografia:Eu, pessoalmente, me vejo como um realizador de dramas. Na minha cabeça, meus filmes são todos dramas que têm elementos de comédia, algumas vezes. Mas não me importo quando dizem que sou um diretor de gêneros. Porque para mim todo filme é um filme de gênero. Para mim, um filme de Eric Rohmer é um filme de gênero. Se você faz um filme como os dele você está fazendo um filme no gênero Eric Rohmer. Mesma coisa com John Cassavetes. E eu mais que ninguém sei disso porque sou responsável por ter tornado Eric Rohmer um dos diretores franceses mais populares de Manhattan Beach, no tempo em que eu trabalhava na videolocadora!
O que ainda quer fazer no cinema:Eu sempre quis fazer um faroeste espaguete e finalmente consegui! Um faroeste espaguete a meu modo, é claro. Acho que eu gostaria de fazer um musical. Às vezes eu penso nisso. Por outro lado, todos os meus filmes são de certa forma musicais, ou pelo menos têm grandes cenas musicais. Eu gosto de usar música do meu modo, sem estar preso a convenções. Imagino que poderia fazer um musical tipo jukebox com um monte de canções que eu conheço e ir compondo a história a partir delas…
O que ninguém ainda entendeu sobre ele:Eu já era um especialista em cinema quando fui trabalhar na videolocadora. As pessoas não se tocam disso. Eu fui trabalhar na videolocadora porque eu era um especialista em cinema. Mas na verdade, quanto mais o tempo passa, mais eu me considero um historiador do cinema do que propriamente um especialista.
A violência em seus filmes:Eu não acho que as pessoas vão ver meus filmes por causa da violência. Elas não vão para ver a violência nos meus filmes. Elas não vão porque eu dirigi uma série de cenas sensacionalisticamente violentas nos meus filmes. Ou pelo menos não vão só por isso… Elas vão por causa do meu diálogo, por causa dos meus personagens, os corações dos meus personagens e a humanidade nos corações dos meus personagens.
Do que mais tem orgulho:Eu tenho muito orgulho das minhas personagens femininas. Eu acho que elas são extremamente femininas, elas falam como mulheres, agem como mulheres e se defendem. Elas não têm medo de atacar para se defender. Não são indefesas, são valentes. E mulheres são assim. Eu mudo o adversário, o local, o vilão, o monstro, dou a elas armas diferentes e soluções diferentes, mas em comum todas elas têm essa força interior que eu acho, na verdade, extremamente feminina e extremamente humana.
Ana Maria Bahiana
Do UOL, em Los Angeles
Quentin Tarantino faz o sinal de paz ao receber o Oscar de melhor roteiro original por "Django Livre"
São 50 anos de vida e 30 anos desde o primeiro filme como realizador, o incompleto “Love Birds in Bondage”, destruído, dizem as lendas, por seu ex-parceiro e ex-amigo, o falecido Scott Magill. São também 21 anos desde “Cães de Aluguel”, sua estreia como diretor, 19 desde que “Pulp Fiction” sacudiu a Croisette, arrebatou uma Palma de Ouro, um Oscar e um Globo de Ouro e nove longas que introduziram um novo termo na linguagem do cinema: tarantinesco.Autodidata -- “não fiz faculdade de cinema, vi filmes. O cinema me ensinou cinema” --, absolutamente passional sobre seu ofício, desconfiado das novidades tecnológicas -- “digital me dá sempre impressão de coisa feita para TV”-- Quentin Jerome Tarantino, de Knoxville, Tennessee, trouxe um vigor pop para a cena do cinema independente que se desenhava em meados dos 1990, e apresentou e reapresentou a novas gerações gêneros de outros tempos e nacionalidades: filme noir, blaxploitation, ação wuxia chinesa, terror slasher, faroeste espaguete, ação-aventura de guerra.
No processo, reinventou a carreira de John Travolta (“Pulp Fiction”), prestou a devida homenagem à diva black Pam Grier (“Jackie Brown”), transformou Uma Thurman numa heroína de ação (“Kill Bill 1”, 2 e o 3, que vem aí), lançou o austríaco Christoph Waltz em Hollywood (e no meio de uma chuva de prêmios -- “Bastardos Inglórios”, “Django Livre”) e resolveu de modo muito pessoal a antiga tensão entre comércio e arte que está na base do cinema, especialmente do cinema americano. “Eu ainda não esgotei a visitação aos meus gêneros favoritos”, ele diz. “Ainda há muito que fazer.”
Um balanço dos 50 anos de Quentin Tarantino, por ele mesmo.
A melhor coisa de fazer 50 anos:É bom não ser mais considerado um garoto. Quando eu comecei, quando “Cães de Aluguel” foi lançado, tudo o que diziam e escreviam sobre mim era para me chamar de garoto, de adolescente, que eu tinha aprendido cinema na videolocadora, etc. É bom saber que pelo menos agora eu tenho mais a oferecer.
O que aprendeu com a maturidade:Eu comecei a acreditar em vidas passadas os últimos dez anos. Sempre pensei nisso, mas de uns anos para cá eu realmente me convenci que isso existe. Como tudo comigo eu não estou cem por cento comprometido com o conceito mas… eu não me surpreenderia se isso fosse verdade. Eu acredito que é inteiramente possível.·
O que mudou ao longo desses anos:Nada no mundo mudou ao ponto de afetar minha arte. Nada, nada, nada. Minha arte, minha voz, minha imaginação, meus personagens, meu modo de contar histórias, tudo isso vai por onde eu quero que vá independente do que acontece no planeta Terra. Isso é meio parte do meu trabalho, não é?
Como vê sua filmografia:Eu, pessoalmente, me vejo como um realizador de dramas. Na minha cabeça, meus filmes são todos dramas que têm elementos de comédia, algumas vezes. Mas não me importo quando dizem que sou um diretor de gêneros. Porque para mim todo filme é um filme de gênero. Para mim, um filme de Eric Rohmer é um filme de gênero. Se você faz um filme como os dele você está fazendo um filme no gênero Eric Rohmer. Mesma coisa com John Cassavetes. E eu mais que ninguém sei disso porque sou responsável por ter tornado Eric Rohmer um dos diretores franceses mais populares de Manhattan Beach, no tempo em que eu trabalhava na videolocadora!
O que ainda quer fazer no cinema:Eu sempre quis fazer um faroeste espaguete e finalmente consegui! Um faroeste espaguete a meu modo, é claro. Acho que eu gostaria de fazer um musical. Às vezes eu penso nisso. Por outro lado, todos os meus filmes são de certa forma musicais, ou pelo menos têm grandes cenas musicais. Eu gosto de usar música do meu modo, sem estar preso a convenções. Imagino que poderia fazer um musical tipo jukebox com um monte de canções que eu conheço e ir compondo a história a partir delas…
O que ninguém ainda entendeu sobre ele:Eu já era um especialista em cinema quando fui trabalhar na videolocadora. As pessoas não se tocam disso. Eu fui trabalhar na videolocadora porque eu era um especialista em cinema. Mas na verdade, quanto mais o tempo passa, mais eu me considero um historiador do cinema do que propriamente um especialista.
A violência em seus filmes:Eu não acho que as pessoas vão ver meus filmes por causa da violência. Elas não vão para ver a violência nos meus filmes. Elas não vão porque eu dirigi uma série de cenas sensacionalisticamente violentas nos meus filmes. Ou pelo menos não vão só por isso… Elas vão por causa do meu diálogo, por causa dos meus personagens, os corações dos meus personagens e a humanidade nos corações dos meus personagens.
Do que mais tem orgulho:Eu tenho muito orgulho das minhas personagens femininas. Eu acho que elas são extremamente femininas, elas falam como mulheres, agem como mulheres e se defendem. Elas não têm medo de atacar para se defender. Não são indefesas, são valentes. E mulheres são assim. Eu mudo o adversário, o local, o vilão, o monstro, dou a elas armas diferentes e soluções diferentes, mas em comum todas elas têm essa força interior que eu acho, na verdade, extremamente feminina e extremamente humana.
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